“Um gemido se esvai lá no espaço/ nessa hora de lenta agonia/ quando o sino saudoso murmura/ badaladas da Ave Maria”(Da música “Ave Maria”,de Erothildes de Campos).
A cidade de Coroatá homenageia, neste mês de outubro, a sua Padroeira Nossa Senhora da Piedade, realizando a sua tradicional festa. O evento se estende do dia 12 ao dia 21 e é organizado pelos dedicados sacerdotes da Paróquia, com a colaboração de pessoas e entidades da vida coroataense.
Infelizmente, ausente da minha querida cidade onde passei os momentos felizes da minha infância e pré-adolescência, só me resta recordar com saudades aquelas comemorações que me enchiam de alegria e, como dizia o poeta: “Eu me lembro das tardes de outrora/que contigo sonhava a poesia/ do amor que feliz te jurava/ ao murmúrio da Ave Maria”.
Naquele tempo, findava as calorentas e brilhantes tardes. O sol se deitava preguiçosamente em seu colo e ia se aproximando por trás das folhagens das mangueiras e cajueiros. A noite se preparava para cobrir a cidade com seu véu negro, quando o badalar dos sinos da antiga igrejinha convidava o povo a orar com todo seu sentimento cristão. Também chamavam para se divertir e saborear os quitutes que eram vendidos nas barracas de palhas de palmeiras de babaçu e montadas em frente ao templo onde, ao contrário do atual, tinha a frente voltada para o sereno e traiçoeiro rio Itapecuru. A capelinha era modesta, mas aconchegante. Tinha as paredes pintadas de azul e nos meus devaneios de criança, ao visitá-la, a impressão que eu tinha era de estar adetrando no céu. Não havia luz elétrica na cidade e as barraquinhas eram iluminadas por alguns motores de baixa potência, pelos lampiões a gás e, principalmente, pelas tradicionais lamparinas do sertão.
Quando era noite de lua cheia, o clarão que vinha do céu minorava um pouco o efeito daquela escuridão que se desdobrava pelos quatro cantos da cidade.
Era pároco da diocese o extraordinário padre Estrela, uma das figuras humanas mais fantásticas que já conheci, o qual tinha como colaboradores os dedicados fiéis Cleris Santiago, Zequinha Campos, Almerinda Gomes, Zazinha, Lola, Dulce Almeida, Maria José Azevedo, Maria Bezerra, Dedé Amorim, Nagib Lamar, Biné Jansen, Chilon Lobo, Temístocles e muitos outros que o tempo vem apagando da minha memória.
Dos mais abastados aos mais humildes, de sapatos ou de tamancos, a maioria do povo, inclusive de outras religiões, se dirigia para o Largo da Igreja, a fim de participar das cerimônias. Os festejos se encerravam com uma procissão constituída de algumas centenas de pessoas que se dividiam em duas fileiras, cada uma de um dos lados da rua, tendo ao centro o andor com a imagem de Nossa Senhora da Piedade, acompanhada do sacerdote e de seus colaboradores, quando eram feitos orações e cânticos religiosos de rara beleza sacra.
Eu freqüentava quase todas as noitadas não somente movido pela fé, mas, também, para me encontrar com meus amigos e com aquelas meninas bonitas da cidade e, logicamente, saborear um gostoso caldo de cana com pastel.
Dizem alguns filólogos que a palavra “saudade” só existe na língua portuguesa. Se de fato é verdadeira esta afirmação, ela tomou conta do meu ser, penetrou de mansinho em minha alma e fez morada em meu coração. É ela que provoca em mim esse sentimento que me faz lembrar os belos momentos passados em Coroatá.
Parabenizo os sacerdotes da diocese, seus auxiliares e o povo em geral pela realização de mais uma festa de Nossa Senhora da Piedade, desejando que ela ilumine os caminhos do povo coroataense.
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Oficial aposentado do Exército e economista
E-mail: joseribamar.ferro@gmail.com
Do Jornal O Estado do Maranhão